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A edição #192 da revista RoadieCrew traz a Tradução da entrevista feita por Steven Rosen (Ultimate Guitar)

 

Devin Townsend - Mente Criativa e Complexa - Por Steven Rosen (Ultimate Guitar)

 

É realmente difícil definir quem é o vocalista/compositor/guitarrista Devin Townsend. Por um lado, ele é a luz que guia o Strapping Young Lad, banda conhecida principalmente por seu segundo disco, City (1997). Por outro, o músico canadense criou no mesmo período o seu segundo trabalho solo Ocean Machine: Biotech, que não tem qualquer semelhança com seu trabalho no SYL. Além disso, ele lança álbuns sob os nomes Devin Townsend Band e Devin Townsend Project, o que faz dele um dos artistas mais prolíficos e criativos da atualidade. Em meio a isso tudo, ele acaba de soltar Z2, um disco duplo composto por Sky Blue (lançamento do Devin Townsend Project) e Dark matters, que seria a sequência de seu disco solo Ziltoid The Omniscient, de 2007. Ou seja, não é terra simples acompanhar a carreira de Devin. Mas basta saber que, onde quer que ele vá, é muito pouco provável que volte para lá. Nesta conversa com a ROADIECREW, Devin falou sobre sua vida e sua música com a sinceridade de sempre.

 

Steven Rosen: Você diria que Promisses, que você lançou com o Noisescapes em 1993, foi o primeiro passo que moldou o artista que você é hoje?

Devin Townsend: Não, eu acredito que começou antes disso. Acho que o que me inspira a escrever é o fato de eu ter uma percepção bem clara do que acontece à minha volta. Muitas vezes é preciso fazer uma investigação consciente e subconsciente sobre o ponto em que você está na sua vida e definir como você deve se posicionar em relação a ela.

 

Steven Rosen: Daria pra explicar um pouco melhor?

Devin Townsend: Por exemplo: eu saí do Strapping Young Lad. Tive filhos, parei de beber, etc. O disco Ki (do Devin Townsend Project, de 2009) tornou-se uma verdadeira compulsão pra mim porque todos os caminhos estavam me levando para a mesma direção.

 

Steven Rosen: Ainda em 1993, você gravou os vocais no disco Sex & Religion, de Steve Vai. Foi um momento importante para você?

Devin Townsend: Oh, meu Deus, claro! Totalmente! Sob todos os aspectos, positivos e negativos. Acho que muito do que me tornei como músico tem a ver com esse período.

 

Steven Rosen: E como foi ser produzido por Steve Vai?

Devin Townsend: A forma como ele trabalha é bem planejada e minha forma de trabalhar como vocalista na época se baseava em cantar letras escritas por outras pessoas tentando criar uma interação com a emoção contida nelas. E isso acabou sendo um pouco confuso pra mim, porque eu levei um bom tempo tentando me encontrar nas letras que ele escreveu.

 

Steven Rosen: Esse foi um dos pontos negativos de trabalhar com ele?

Devin Townsend: Eu cheguei num ponto em que disse pra mim mesmo: 'Nunca mais ninguém vai me produzir!' Desde então, quando alguém tenta me dizer como devo cantar, quando me convidam para cantar como convidado em algum disco ou algo do tipo, sempre acabo recusando. Então, acabou sendo, sim, um ponto negativo.

 

Steven Rosen: Em 1994, você, Jason Newsted e Tom Hunting (Exodus) criaram o IR8, que fazia um som completamente diferente de Steve Vai.

Devin Townsend: Nessa banda eu só toquei guitarra, o que foi muito legal, também. Jason era o vocalista. E houve um momento de atrito entre nós porque eu queria fazer algo totalmente diferente. Acho que esse foi um grande problema que tive com várias pessoas depois de trabalhar com Steve Vai. Eu sempre queria fazer algo diferente e nunca conseguia. Quando saí do IR8, fui trabalhar com Geezer Butler e minha reação foi a mesma: ‘Não estou gostando disso, não estou curtindo a forma como está soando.’ Foi uma situação semelhante à que e aconteceu com Jason. Eu achava que os vocais deveriam ser diferentes. Olhando isso hoje, eu acho legal pelo fato de que eu já tinha uma visão bem clara do que eu queria na música, mas concordo que em alguns momentos eu passei dos limites… (risos)

 

Steven Rosen: O seu primeiro disco solo foi Punky Brüster - Cooked On Phonics, que saiu em 1996.

Devin Townsend: Isso. Punky Brüster levou uma semana para ser escrito e duas para ser gravado. Na verdade, meu novo disco, Dark matters, é o que mais se assemelha a Punky Brütter - só a história é diferente. Punk Brütter surgiu quase por acaso, não teve nenhum planejamento. Foi uma brecha que eu consegui num estúdio, fui lá e fiz o disco. Nem teve lançamento oficial, mas é sim o meu primeiro lançamento. E o que me motivou a fazê-lo nem foi tanto o aspecto musical, eu me interessei mesmo pela idéia de fazer um disco conceitual de comédia.

 

Steven Rosen: City foi o segundo lançamento do Strapping Young Lad. É um disco marcante e que parece mostrar claramente quem era você enquanto artista.

Devin Townsend: Concordo com você. Ele e Ocean Machine: Biomech (disco solo do mesmo ano) são dois discos em que eu tentei reunir todas as minhas experiências até então e criar minha identidade - aquela confusão que acontece quando você está nos seus 20 anos… Eu me achava capaz de traçar uma trajetória musical bem clara e tanto City como Ocean Machine: Biotech permanecem na mente das pessoas e até mesmo na minha como as melhores coisas que eu já fiz.

 

Steven Rosen: E o interessante é que ambos foram lançados no mesmo ano.

Devin Townsend: Esse foi um período muito importante para mim. Eu saí da banda de Steve Vai e entrei no Wildhearts, da Inglaterra. Era uma banda formada por bons amigos, mas a cena da época não ajudou em nada. Então, voltei para casa e comecei a procurar emprego. Acabei trabalhando num restaurante. Até que me dei conta: ‘Que diabos está acontecendo?’ Foi quando resolvi que ia voltar para Los Angeles. Fui para lá, fiquei morando na casa de uns amigos e foi nesse contexto que eu acabei fazendo os dois discos.

 

Steven Rosen: História interessante.

Devin Townsend: City acabou sendo um disco sobre Los Angeles - e nós acabamos gravando-o no  estúdio de Steve Vai. Chamei Daniel Bergstrand para trabalhar como técnico de som nos dois discos e ele conseguiu a sonoridade que eu procurava. E também acho que foi nessa época que eu acabei me isolando.

 

Steven Rosen: A propósito, você foi diagnosticado com transtorno bipolar também em 1997. É por isso que os dois discos soam, ao mesmo tempo, alegres e sombrios? Ou isso se deve simplesmente ao fato de que você, como artista, tem todos esses gêneros de música dentro de si?

Devin Townsend: Acho que há uma grande diferença entre ser bipolar e ficar meio cheio de um estilo musical pelo qual você era quase obcecado e passar a querer fazer algo diferente. É assim que funciona. As pessoas tentam colocar tudo sob uma perspectiva esquizofrênica, mas é a parte criativa que domina isso. Então, o nível compulsivo com que eu trabalho as músicas, as produções, as mixagens teria me irritado de forma que eu só consegui paz quando soltei os discos? As pessoas tendem sempre a levar para esse lado.

 

Steven Rosen: Em 1999, você voltou a conversar com Jason Newsted para que ele trabalhasse no disco Physicist (2000), mas isso não aconteceu. Por quê?

Devin Townsend: É verdade. Eu mostrei o disco para ele e imagino que ele pensou: ‘Pô, cara… Eu fiz parte do Metallica, não estou a fim de tocar no seu disco.’ Esse foi o tipo de clima que eu percebi na época. O nome dele era muito forte na época. Mas eu fiquei muito desapontado e resolvi fazer tudo por minha conta.

 

Steven Rosen: Você ficou satisfeito com o resultado desse disco?

Devin Townsend: Acho que não alcancei meus objetivos com ele. Fazer Physicist foi uma espécie de purgar a fase de Infinity (disco solo anterior, de 1998). Eu tinha atravessado uma série de problemas na minha vida pessoal, estava muito deprimido. Estava numa fase negra… Então, eu tenho na minha memória que Physicist representa o meu estado de espírito daquela época - e é algo de que não me orgulho muito…

 

Steven Rosen: Terria é o disco solo que você gravou em 2005 e tinha uma pegada mais pessoal e acústica. Esse trabalho representou uma grande mudança no seu direcionamento musical, não?

Devin Townsend: Sim, sem dúvida. Eu me orgulho muito desse disco. E acho que me orgulho principalmente pelo tanto que me dediquei a ele, pelo quanto da minha personalidade eu coloquei no disco. Não acreditei quando Physicist não obteve o resultado que eu esperava. Então, estava determinado a fazer um álbum que provasse não apenas aos meus fãs, mas principalmente a mim mesmo que eu ainda era capaz de fazer um disco do qual eu me orgulhasse.

 

Steven Rosen: Músicas como Tiny Tears e Down And Under mostraram você, de certa forma, até vulnerável…

Devin Townsend: Terria foi um disco em que, pela primeira vez, eu coloquei à frente a minha personalidade. Não teve nada de ‘eu sou o cantor da banda do Steve Vai’ ou ‘eu sou o sujeito à frente do Strapping Young Lad’. Dessa vez, eu disse simplesmente: ‘Eu sou Devin.’ Entende onde eu queria chegar? Eu tomei consciência dos meus pontos fracos e dos fortes e, apesar de ser um apaixonado pela música pesada, naquele momento eu estava mais a fim de tocar uma Fender Stratocaster do que uma Gibson Explorer.

 

Steven Rosen: Você pode contar como escreveu uma música tão incrível como Tiny Tears?

Devin Townsend: Foi no piloto automático… Mas, antes de qualquer coisa, obrigado por suas palavras. Eu fico muito feliz, mas repito, foi no automático. Na verdade, eu creio que os compositores não são os responsáveis pelas músicas. Acho que elas lhe perseguem e lhe irritam até que você as escreva.

 

Steven Rosen: Um pouco antes, em 2003, você lançou o disco Strapping Young Lad, que foi o primeiro da banda desde City. O fato de ser um disco brutal tem a ver com os eventos de 11 de setembro de 2001?

Devin Townsend: Não, não teve nada a ver com isso. Foi uma resposta minha ao fato de me sentir desconfortável por ter decidido não ser mais um sujeito legal. Quando eu fiz o City fiquei meio descontrolado porque pensava que era algo muito destrutivo. Eu não queria que algo como aquilo me representasse.

 

Steven Rosen: Já Alien (2005) é o quarto disco do Strapping Young Lad. Ele é uma consequência direta de você ter parado de tomar seus remédios?

Devin Townsend: Bem, ele é resultado de uma série de coisas. Em relação ao meu problema com bipolaridade  drogas, o fato é que as pessoas tendem a colocar a culpa de tudo nas drogas, não é verdade? Eu fiz o mesmo. Quando recebi meu diagnóstico, recebi no mesmo momento uma receita médica. Tive que tomar antipsicóticos e antidepressivos. Então, até por causa do estigma que isso cria, o que eu fiz foi começar a beber e fumar maconha ao mesmo tempo em que me medicava.

 

Steven Rosen: E foi nesse ponto que você começou a trabalhar em Alien?

Devin Townsend: Quando comecei a trabalhar em Alien, pensei: ‘Eu não estou maluco e vou provar isso. Vou parar com esses remédios.’ Mas não parei com a bebida, nem com a maconha. Vivemos uma época - e eu quero ser bem claro em relação a isso - em que os medicamentos psiquiátricos funcionam para um monte de gente. E funcionaram para mim, também. Então, não devia ter feito isso. Mas optei por ser arrogante. Pensava: ‘Não sou bipolar. Vou provar isso. Vou parar com esses remédios e continuar com o resto.’ Só quando você pára com esse tipo de remédio tem que passar por uma desintoxicação. E nesse período tem que parar com tudo mesmo, é algo que às vezes leva um ano.

 

Steven Rosen: E The New Black (2006) foi o último disco do SYL?

Devin Townsend: A essa altura, eu tinha me dado conta de que continuar com a banda não seria apenas pouco saudável para mim, seria masoquismo. Eu fiz The New Black, tocamos no ‘Download Festival’ e avisei para os caras da banda que não queria continuar. Alguns entenderam, outros não. Foi uma separação difícil, mas continuamos amigos até hoje. Nós já trabalhamos juntos de novo e acho que isso vai se repetir pelo resto de nossas vidas.

 

Steven Rosen: Parar com uma banda nunca é simples.

Devin Townsend: A forma como eu trabalho é bem diferente do modo como os outros o fazem, incluindo os caras da banda. E, naquele momento, me obrigar a continuar com aquilo era algo que eu não estava disposto a fazer. Então, resolvi acabar com o grupo, o que foi algo bem desafiador para todos nós.

 

Steven Rosen: E o que aconteceu depois disso?

Devin Townsend: Durante esse período, minha mulher e eu resolvemos ter filhos. Foi terrível! Minha mulher grávida e eu fumando maconha como se não houvesse amanhã! E eu me sentia terrível quando fumava, eu não apenas ficava alto, eu ficava cada vez pior. Era um show de horrores cada vez que eu acendia um baseado. Então, resolvi parar com aquilo. E parei. Mas comecei a beber. me sentia orgulhoso por ter parado de fumar, mas enchia a cara todo dia…

 

Steven Rosen: Isso é trocar uma droga pela outra…

Devin Townsend: Eu comecei a engordar. Ganhei trinta quilos, estava sem banda e sem perspectiva. A autoestima estava lá embaixo. E como eu estava sem fumar, achava que nunca mais iria conseguir compor… (dá um riso nervoso)

 

Steven Rosen: E foi nesse contexto que você fez o disco Ziltoid The Omniscient (2007)?

Devin Townsend: Esse foi um disco que, de certa forma, me purgou de tudo isso. Depois dele houve um período de pelo menos dois anos em que eu simplesmente não conseguia compor. não sabia o que fazer, tudo soava diferente para mim.

 

Steven Rosen: Você nem sabia quem você era, imagino…

Devin Townsend: Eu acabei entrando numa espécie de retiro. E tentei várias coisas para ver se me sentia melhor. Tentei várias coisas, mas nada dava certo.

 

Steven Rosen: E acabou encontrando algo?

Devin Townsend: Eu cheguei à conclusão que tinha medo de mim mesmo. Temia o meu eu que tinha escrito Infinity e que podia machucar as pessoas e do meu eu que tinha feito Alien e poderia machucar a mim mesmo, já que estava num processo autodestrutivo. E tinha medo de voltar a escrever e acabar sabotando a mim mesmo. Foi quando resolvi purgar isso tudo. 

 

Steven Rosen: E resolveu?

Devin Townsend: Resolvi voltar a escrever. Escrevia o que vinha na cabeça. E foi nesse período que fiz Ki, Addicted (2009), Deconstruction (2011) e Ghost (2011). Isso é o Devin Townsend Project, um projeto em que cada um dos discos mostra o que eu estava tentando dizer quando estava incapacitado de me relacionar com as pessoas. E Epicloud (2012), Casualties Of Cool (2014) e Z2 são um resumo disso tudo.

 

Steven Rosen: E quais seus próximos passos?

Devin Townsend: Agora eu quero trabalhar com pessoas com quem eu possa colaborar, não o contrário. Não quero ser o centro do negócio. Vamos ver o que acontece.

 

Steven Rosen: Há pouco nós falamos sobre seu trabalho com Steve Vai e Jason Newsted e sobre como foi complicado para você não ter o controle da situação. Agora você quer justamente isso, abrir mão do controle. É isso?

Devin Townsend: Sim, mas depende das pessoas com quem vou trabalhar. E tenho certa dificuldade de imaginar que essas colaborações vão ser com pessoas que já participaram do meu passado, para ser honesto.

 

Steven Rosen: Eu não quis dizer especificamente que você iria se reunir com pessoas com quem já tinha trabalhado antes, mas sobre o fato de estar disposto a abrir mão do controle.

Devin Townsend: Ah, sim. E ter filhos ajuda nesse processo porque rapidamente você se dá conta de que não é o centro do universo. E quando estava fazendo Infinity eu tinha certeza que era. Aí você chega num ponto em que percebe que é muito menos importante do que pensa.

Fonte/Link da entrevista em inglês:
http://www.ultimate-guitar.com/interviews/interviews/devin_townsend_i_wanna_be_part_of_something_i_dont_wanna_be_the_thing.html

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